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  • Foto do escritorKatherine Carvalho

Eu sou feita de outras pessoas

Eu sou feita de outras pessoas.


Quando nasci, minha mãe soprou em meu ouvido um pouquinho dela, e até hoje eu sei que o amor é a resposta pra tudo, e que bondade, compaixão e caridade são aprendizados diários. Porque foi ela que disse que tudo o que vai, volta, e que se eu só desejar o bem, o bem volta pra mim também.


Porque foi com ela que eu aprendi a ter fé, e desde então Deus nunca me deixou faltar nada. Porque era ela que dizia que eu não precisava me preocupar com a maldade do mundo, desde que eu fizesse o que estava ao meu alcance.


O meu pai soprou em meu ouvido ideias de coragem, liberdade e rebeldia, porque até hoje eu lembro dele quando me desequilibro e decido tentar de novo, ou quando ouso erguer a voz quando mandam eu me calar.


Porque era ele que me pegava nos braços e me jogava pra cima, ainda que eu dissesse que estava com medo — porque foi ele que me segurou quando eu caí de bicicleta e disse “calma, que do chão não passa”. Porque foi ele que disse que se alguém mexesse comigo na escola, eu não podia simplesmente ficar quieta.


Porque foi através deles que eu percebi que o mundo não era assim um lugar tão ruim, e que eu poderia fazer dele a minha casa — porque foram eles que me disseram “vai lá, filha, você consegue, tenta de novo”, e de tanto tentar, um dia eu consegui.


Eu sou feita de outras pessoas: um aglomerado de um pouquinho dela, um pouquinho dele, um amontoado de pedacinhos, uma junção de coisas que tornam as pessoas únicas e que por isso me tornam única também.


Há muitas maneiras de se criar uma criança, mas tudo depende do que você sopra no ouvido dela quando ela é pequena. O sopro deles me fez inteira, e inteira consigo enxergar a vida como ela realmente é: boa, cheia de surpresas, difícil, mas absurdamente fascinante.


Um dia, terei meus próprios filhos e soprarei em seus ouvidos um pouco de mim, como meus pais fizeram comigo, e haverá um momento em que eles soprarão no ouvido dos filhos deles — assim, ninguém desaparece, não por completo, e meus pais estarão vivos, no sopro de vida dos meus netos, mesmo muito depois de terem ido embora.

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Por Katherine Carvalho

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