Atenção: esse texto não está em formato de lista, mas é uma lista, só que funciona mais como um desabafo e não segue nenhuma regra, assim como tudo neste blog. Ah, e você pode encontrar alguns palavrões ao longo da leitura, lamento.
Quando digo que estou cansada, não me refiro ao meu corpo, e sim à minha mente. Existem momentos em que o corpo descansa, como à noite, durante o sono, mas a mente não para por um minuto sequer. Mesmo quando estamos dormindo, o cérebro está lá, trabalhando, produzindo sonhos, reavivando memórias, trazendo à tona nossos medos mais aterrorizantes, nossos desejos mais profundos. Quando digo que estou cansada, é porque dormir não é o suficiente — não tem como desligar a mente. E se você nunca experimentou o cansaço mental, caramba, que sorte a sua, porque ele pode ser bem pior que o cansaço físico. Estou cansada, sim, e não é porque trabalhei muito, nem porque corri no parque, nem porque fui ao mercado carregar sacolas pesadas, muito menos porque passei o dia inteiro batendo perna no shopping. Estou cansada porque não paro de pensar. Parece que só faço isso, 24h por dia, a vida inteira. Pensar, pensar, pensar
pensar
pensar
pensar
pensar
pensar
pensar
pensar
se você não sabe o que é isso, fico feliz por você, e triste por mim. Pensar é exaustivo e quando digo que estou cansada, lembre-se que o cansaço físico não é o único que existe. Valide minha dor, valide minha queixa, valide meus sentimentos. Saiba que o meu corpo não funciona como o seu, estude Biologia.
Querido Deus, um dia alguém me disse que minha depressão era falta de Deus, e embora o Senhor fale que a gente tem que amar o próximo, tem uns “próximos” que fica bem difícil. O que eu queria dizer pra essa pessoa é o seguinte:
minha espiritualidade em nada tem a ver com o desequilíbrio químico no meu cérebro
eu sempre tive fé em Deus e mesmo nos piores momentos eu o sentia presente
Deus não abandona ninguém, muito menos quem está em sofrimento psíquico
a depressão apenas me aproximou Dele
e se hoje eu sei ser feliz é porque Ele esteve comigo quando eu estava triste
Quando alguém me diz que eu tenho que tentar, a minha vontade é responder “e você acha que estou fazendo o quê, seu bosta?”. Tentar é tudo que eu faço (além de pensar). Obrigada por me lembrar que tento
tento
tento
tento
tento
e não consigo.
Mas um dia eu vou conseguir e aí você vai engolir isso que você disse. Porque quando eu fiquei doente eu sentia um vazio horrível, mas com o tempo, graças à medicação e à terapia, eu voltei a sentir coisas. Voltei a sorrir, voltei a dar risada com filmes de comédia, voltei a sentir fome, voltei a me achar bonita. E aí um dia eu voltei a sentir raiva. E de você, que me disse isso, eu tenho bastante raiva.
Ninguém nunca fez isso, mas se um dia alguém tivesse me dito que eu deveria me cuidar mais, a resposta provavelmente teria sido essa: “e você vá cuidar da sua vida no quinto dos infernos”. Já experimentou passar um hidratante no corpo ou uma maquiagem com o peso do mundo nas suas costas? Não? Então experimente antes de vir falar merda. A depressão me roubou a felicidade e também levou embora toda a paciência que eu já não tinha.
Aí sempre ouço a famosa frase que “ai, não tomo remédio porque remédio vicia”. Sim, seu idiota, claro que um diabético vai viciar de tanto tomar insulina, é claro… QUE NÃO. E se for pra viciar, ótimo, que eu vicie logo então. Melhor viciar numa coisa que me faz ficar bem do que em outra que me faz ficar mal, né, colega?
Sobre a terapia, tem muitas coisas que eu gostaria de dizer, mas a principal delas é uma resposta àqueles queridos que dizem que fazer terapia não é necessário, afinal, “é só conversar com um amigo”, certo? Sim, claro, agora me responda VOCÊ o que diabos eu vou fazer quando eu conto um problemão pra alguém e a pessoa me responde apenas “foda, né?”.
Também gostaria de salientar que depressão não é falta do que fazer. Porque se fosse, eu nunca teria ficado doente, já que eu tinha muita coisa pra fazer
eu tinha escola pra ir
eu tinha livros pra ler
eu tinha amigos com quem sair
eu tinha histórias pra escrever
e parei tudo isso por causa da depressão, não porque eu não tinha o que fazer, mas porque eu não conseguia fazer, e entre essas duas coisas, meu bem, existe um abismo bem grande.
Claro que tem gente muito pior que eu, e eu sinto muito por elas. Assim como existe gente bem pior que você, querida pessoa que teve a infelicidade de me dizer isso, agora não reclama se eu enfiar uma tora você sabe onde, porque afinal, tem gente muito pior que nós dois.
Ah, e eu também tinha tudo, ou melhor, tudo o que a maioria das pessoas parece acreditar que é o suficiente pra gente se blindar contra doenças mentais: família legal, comida na mesa, escola boa, era uma menina razoavelmente bonitinha, vivia num lugar bacana, mas eu não tinha uma coisa: paz de espírito. Pelo visto quem diz isso também não tem.
A última coisa que eu gostaria de dizer sobre ter depressão é que a gente já sofre demais sem os seus comentários desnecessários, então no que puder me poupar, me poupe, é um favor que você me faz. Se você se identificou com algum dos itens acima, dois conselhos pra você: aprenda a responder à altura ou pare de falar asneiras.
Desculpa se esse texto pareceu agressivo. É que, na verdade, ele é agressivo mesmo. Quem tem depressão é obrigado a escutar muita coisa desagradável e ser educado nem sempre resolve. Quem sabe um pouquinho de agressividade não funcione desta vez?